segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Verdade Pt2

Chegou na casa, finalmente. Portões abertos, o churrasco era grande. Entrou. Logo encontrou seus amigos, já estavam bebendo. Deram-lhe uma latinha de cerveja, estava meio quente, mas era o que tinha.

-Faz tempo que cêis tão aqui? – Perguntou para Marcelo.

-Não, por que cê demorou?

-Ah, acabei dormindo demais. Fiquei puto no ônibus, um babaca ficou me encarando!

-Bebe que passa... saúde!

-Saúde.

Algumas latinhas depois já se sentia mais à vontade. Era chato ser o único mais sóbrio no meio dos bêbados. Mas mesmo assim ainda não estava bem. Todos riam, mas ele não conseguia esquecer dos gritos. Parecia que a voz ainda ecoava na sua cabeça.

Não muito longe uma menina olhava diretamente pra ele. Procurou por alguém para trás dele, não tinha ninguém. Era pra ele mesmo. Cabelos pretos, pele clara, muito bonita.

-Ou, olha lá, do lado da churrasqueira. Bonitinha, hein? – perguntou pra um de seus amigos.

-Aonde, cara?

-Do lado da churrasqueira! Cabelo preto...

-Tem gente na minha frente, não tô vendo ninguém.

-Melhor assim! Vou lá falar com ela.

Andou até a churrasqueira, fingiu olhar a carne e virou para ela.

-Oi!

-Oi. – Era bonita mesmo, só não tinha respondido de forma muito simpática.

-Quer uma cerveja? Vou pegar uma pra mim, se quiser trago pra você.

-Pode ser...

Foi até o balde e pegou, tão quente quanto as outras.

Com a cerveja conseguiu puxar papo, Júlia, isso era tudo o que sabia sobre ela. Quando percebeu os dois já estavam trocando beijos.

-Não quer ir pra algum lugar mais reservado? – Ela perguntou. Ele levou um susto, mas gostou da idéia.

Os dois saíram procurando algum lugar. Uma árvore grande do lado de uma casa parecia mais reservado. Os dois se encostaram nela e ficaram lá . Após alguns beijos ele percebe um cachorro do lado, era um doberman, rosnava para ele. Ficou assustado. No mesmo momento alguém passa na rua.

-Ou! Ta aí sozinho? Fazendo o que?

Não conseguia responder, o cachorro parecia pronto para ataca-lo. A menina não estava mais lá, certamente fugiu com medo do cachorro e ele nem percebeu. O animal latia ferozmente. Saiu correndo, a porta da casa estava aberta. Entrou e fechou-a.

-Porra, aquele bicho ia me matar!

-Ia nada. A Josephine num faz nada pra ninguém! Você tava lá no churrasco, não tava?

-Josephine? Isso é nome de cachorro? É, eu tava sim.

-Ah, eu gosto, Josephine. É sempre assim, a festa começa só lá, mas se espalha pras outras casas também, fica à vontade. Tem mais duas cadelas lá trás, só avisando, você parece ter medo de cachorro.

-Que medo, o que! Ela tava rosnando e latindo pra mim, aí eu fico com medo mesmo.

Andava pela casa, era grande, gostou de lá. Foi conhecer o fundo, não tinha mesmo medo de cachorro.

-Tá fazendo o que aqui? – Era o Marcelo, sentado em um sofá com uma menina.

-Sei lá, entrei aqui.

Passou, não estava afim de conversa. No fundo tinha uma piscina, não era grande, mas era uma piscina. Encontrou os cachorros, um labrador e um vira-lata. Brincou um pouco com elas, gostava de cachorros.

Em um certo momento as duas passaram a rosnar para ele. Não conseguia entender.

-Eu estava encostado lá nas árvores, será que algum cheiro deixa elas assim? – gritou para o Marcelo que olhava do sofá.

-É, o cheiro! – sentiu um tom de ironia na resposta.

A labradora tentou morder seu dedo. Foi por pouco, só raspou no dente dela. Achou melhor sair andando, chega de cães por hoje! Logo que entrou na casa, bem em frente ao sofá onde Marcelo estava resolveu olhar para o dedo. Era sangue pra todo o lado!

-Filha da puta! Olha o que ela fez no meu dedo!

O sangramento só piorava, até que o sangue começou a espirrar vigorosamente pelo corte, indo direto na cara de Marcelo e da menina.

-Porra! Olha isso!

Marcelo fez uma cara de desdém, parecia não se importar com o sangue.

-Qual seu problema, porra?! Olha quanto sangue!

-Larga de frescura...

-Vai se fudê! Filho da puta...

Saiu andando e entrou no primeiro banheiro que encontrou. Trancou a porta e abriu a torneira. Lavou todo o sangue. Não havia corte. Não é possível!

-Ah! De onde você saiu?! Quem é você?!

-Sei lá, tava aberta, resolvi entrar.

-Porra nenhuma! Eu tranquei a porta!

-Eu tô aqui dentro, acho que você não trancou.

-Sai daqui então! Agora!

Fechou a porta, trancou-a, tinha certeza dessa vez. “EEEEI!”. Era a mesma voz. Era o homem que estava dentro do banheiro. Abriu a porta de uma vez. O sujeito sorria enquanto, cinicamente, olhava para sua cara.

-Quem é você? – Perguntou enquanto puxava o estranho para dentro e trancava a porta.

-Boa pergunta. Quem é você?

-Não tô de brincadeira, seu filho da puta. Você estava no meu apartamento hoje, gritou várias vezes do jeito que acabou de gritar!

-Algum problema com os gritos?

-Algum problema com você entrar na minha casa! Como você entrou? Responde caralho!!

-Você me colocou lá dentro.

-Eu?! Vou te pôr dentro de alguma coisa, seu filho da puta!

Pegou a cabeça do homem e bateu-a contra o espelho. Viu os inúmeros cacos caindo e tudo que pôde sentir depois foi o homem empurrando um deles contra seu pescoço.

***

O teto era branco. No entanto o lustre não era o mesmo. Nem a cama, nem o chão, nem as paredes. Muito menos seu pescoço e sua cabeça. Cortes espalhados por todo seu rosto. Que dor. Não era um hospital, era muito bonitinho pra ser um hospital. Ouvia vozes fora do quarto.

-... ele batia nas cachorras e dizia que elas estavam tentando morder ele por causa do cheiro da árvore. Eu vi ele numa árvore, tava estranho. Ele chegou e começou a me mostrar quanto sangue saia do dedo dele, a cachorra nem conseguiu morder, se tivesse mordido, azar o dele. Então, depois disso foi para o banheiro, fechou a porta, abriu, fechou... começou a gritar, parecia um louco! Fazia uma voz diferente, brigava com ele mesmo, até que ouvi o barulho do espelho quebrando. Encontrei ele com o rosto cheio de cacos e um pedaço no pescoço.

Tentou levantar-se. Estava amarrado à cama.

-EEEEI!! – Assustou-se com seu próprio grito.

Marcelo e o médico entraram correndo no quarto.

-Eu bati nos cachorros? Não saia sangue do meu dedo? Que porra que aconteceu? Me conta!

-Ah...

-Eu bati ou não?! Conta como foi!

-Eu não sei como foi!

-Me conta a verdade, como foi de verdade!

-E eu é que sabe como foi de verdade?

Ainda deitado, sentindo as mãos presas ao lado do corpo ele olhou para o alto e viu o conhecido lustre mais uma vez, ainda fora de foco. Fechou os olhos e tudo ficou negro.

Um comentário:

Alice Agnelli disse...

julia: virou um doberman e passou a se chamar josephine.

(as conversas com o fontes e midori fizeram as idéias de superpoderes invisibilidade/gente voadora/gente virando bicho/etc. ficassem guardadas no seu inconsciente.

sangue: se o sonho tivesse sido de ontem pra hoje, é culpa daquele filme. eu disse que devia ser bem violento quando a única razão por ser 18 era "violência".

EEEEI!!: pelo menos não era "a modernidade..." que nem seu coleguinha conservador ouvia, tremia e perdia o sono! hhaeuhauhae

cachorro: "Afeição sincera e desinteressada. Se o cachorro tem uma atitude amistosa para com você espere alegrias. Se estiver no seu encalço: discussões. Levar uma mordida: traição. Sorte: cachorro."

disso daí, pega a última parte e vai jogar no bicho.

quisera eu ter sonhos assim cinematográficos, mano!
;)